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domingo, 20 de agosto de 2006
Adélia Prado: a Bridget Jones das "lobas" - II
Como nem todo mundo tem acesso ao conteúdo restrito do UOL, aí vai a matéria na íntegra (com grifos meus).

Público pede mulheres "maduras"
Sucesso da poeta mineira Adélia Prado na Flip aponta para a explosão de novo filão de literatura feminina no mercado

EDUARDO SIMÕES
MARCOS STRECKER
SYLVIA COLOMBO

Nem Prêmio Nobel norte-americana, nem polemista inglês, menos ainda marxista paquistanês.
Quem roubou a cena na 4ª Flip (Festa Literária Internacional de Parati), encerrada no último domingo, foi a poeta mineira Adélia Prado, 71.
Em um auditório abarrotado e maravilhado pela sua pregação do afeto, Prado gerou uma experiência quase mística. Foi de chorar. O que ela fez, aliás, enquanto lia poemas.
O espetáculo catártico de Parati é apenas mais um sinal do aumento do interesse do mercado por um filão da literatura feminina que também abarca outras autoras, como as gaúchas Lya Luft, 67, e Martha Medeiros, 44, e a norte-americana Joan Didion, 71 (que já vendeu 32 mil cópias de "O Ano do Pensamento Mágico" aqui).
Essa vertente de-e-para mulheres "maduras" caracteriza-se por fisgar principalmente as leitoras de 40 anos ou mais, pelo sentimentalismo exacerbado e por tratar de temas como a família, a perda e a religião.
Faz contraponto à linha "Bridget Jones", na qual escritoras, geralmente mais jovens, falam de relacionamentos e de sexo (a turma do discurso "ele não liga no dia seguinte").
O colunista da Folha Manuel da Costa Pinto diz, ainda, que esse filão tem um quê de auto-ajuda, pois exalta o "estado de espírito sereno e a conciliação com a vida".
Adélia Prado, cuja obra é relançada agora pela Record, tem um público que ultrapassa esse nicho, além de ser mais sólida do ponto de vista literário. Porém, o "revival" de sua obra hoje tem muito a ver com essa nova demanda das leitoras contemporâneas.
Ela explica a explosão emotiva de seu público na Flip: "Eu falei de valores, e valores afetam. Acho muito difícil discutir essas coisas sem que a emoção nos espreite." Segundo ela, seu público é variado, mas a busca é comum. "Tenho certeza de que procura o mesmo que eu: achar num texto alguma coisa que ofereça, independentemente da vida e da pobreza do autor, um sinal de algo belo e maior que nos sustente e nos aguarde para um face a face."
A editora Isa Pessoa, da Objetiva, identifica Martha Medeiros ("Divã") como uma escritora que alcança o mesmo "perímetro da sensibilidade feminina" que Adélia. Medeiros, 44, admite o forte apelo do livro entre as mulheres e avalia que existe um espaço cada vez maior para o tipo de literatura da poeta. "Há um culto à solidão, as pessoas estão muito solitárias e desconfiadas. Surge uma brecha para alguém como a Adélia traduzir esses sentimentos. Ela, com sua sensibilidade, faz isso muito bem."
Lya Luft talvez seja o maior expoente desse "gênero" - já vendeu 550 mil cópias de "Perdas e Ganhos", mistura de ensaio e memória cujo tema é o amadurecimento, de modo bastante pessoal. Em outubro, chega às livrarias seu novo livro, "Em Outras Palavras", também pela Record.

Clube das mulheres
A designer carioca Patrícia Costa, 42, foi uma das muitas mulheres que se emocionaram com a apresentação de Adélia. "Sócia" de um clube de mulheres que não perde nenhuma Flip, ela levou para casa quatro títulos da autora e considera que o sucesso de Adélia se deveu ao fato de ela se afastar de temas políticos e saber tocar as pessoas "em seu íntimo".
"A política é mais racional, fala à nossa indignação. Adélia falou das grandes questões da vida, da sensação de esvaziamento, da falta de contato humano e de afeto que é muito presente hoje. A gente carece de falar sobre sentimentos e ela não teve vergonha de se expor quando falou de suas perdas. Ela chorou, nós choramos. Estávamos todas no mesmo barco", diz Costa.