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Versão 3.2/2008: Tudo na vida é uma questão de prioridade, comedimento e tolerância.
quinta-feira, 17 de novembro de 2005
Mais uma do Eco. Mais uma do Marcos Sá Corrêa. "Jornalismo Ambiental não é falar sempre dos mesmos problemas."
Dois dias de conversa com técnicos de Camaçari, um pólo de indústrias pesadas, mostram que jornalismo ambiental não é falar sempre dos mesmos problemas.

Na tela e em cores, despontando como ilhas vulcânicas das ondas mansas que embalam os relatórios de qualidade do ar no Pólo Petroquímico Camaçari, os picos repentinos de poluição pareciam ainda maiores do que nos gráficos onde anos atrás foram avistados pela primeira vez . (...) E devem ter inquietado os técnicos como faziam agora a platéia se remexer nas cadeiras do auditório escuro, entre quatro paredes cegas, no núcleo de convenções de um hotel turístico, a poucos passos do verão sem-fim que lá fora punha à disposição dos presentes mais um dia de praia no litoral baiano.

Não é preciso dizer mais. Já deu para entender que se tratava de um seminário (...). No caso, era um seminário sobre jornalismo ambiental. E naquele momento ele se dividia entre o jornalismo, que ocupava a maior parte da platéia, e a ordem do dia ambiental, que estava de pé no palco. Falando, o químico Demósthenes Miranda de Carvalho dava a impressão de saber, por experiência própria, o efeito que aquele flagrante de poluição do ar teria sobre os repórteres, a essa altura meio entorpecidos na audiência pela longa exposição a gráficos complicados e símbolos indecifráveis. Era aquela hora do dia em que o sol bate tinindo num mar resplandescente. E todo mundo sabe que palestra com muito número no Powerpoint é mistura indigesta até para ruminar o café da manhã.

(...)

O alagoano Manoel Maia Rocha, do alto de seu PhD em recursos hídricos, que para espanto dos colegas preferiu aplicar no Nordeste brasileiro depois de sete anos de estudo no Canadá, contava como se monitora, protege ou recupera a água do subsolo num terreno ocupado por indústrias tradicionalmente poluentes e sujeitas a vazamentos tóxicos, quando esbarrou sem querer na transposição do Rio São Francisco. É o tipo do assunto que, em boca de político, costuma espadanar nas páginas dos jornais sem dar um passo à frente.

Maia Rocha livrou-se dele como se afastasse um mosquito zumbindo na sala. “No sertão da Bahia chove mais do que em Paris ou Londres”, ele disse, levando o auditório a se mexer novamente nas poltronas. E explicou que não é propriamente de água que mais carece o semi-árido nosdestino. Falta mesmo faz o armazenamento, porque a água que cai do céu escoa depressa pelo velho chão cristalino, impermeável demais para retê-la. Levar água de um lado para o outro no sertão é contra-senso, porque isso o solo já faz sozinho há muito tempo. Dito isso, voltou ao tema com a pressa de gente que tem mais o que dizer sobre outros assuntos, mesmo vivendo num Brasil cada vez mais obrigado a discutir sempre as mesmas coisas. Em poucas palavras, jornalismo ambiental é isso.

O artigo na íntegra está aqui.